Vai já para além do meio século que a velha Cerca dos Frades franciscanos que habitaram o Convento de Santo António de Massorim saiu da devassa em que entrara com a ocupação pelas Casernas de soldados e começou a ser restituída, não à figura do “horto deleitoso” para o meditativo vagabundear dos bons dos fradinhos, mas como espaço de fresquidão, de gozo e lazer dos veros habitantes da cidade que haveriam de ler nesse impressivo fuste do arvoredo, nesse poético jogo da sombra e da luz que a folhagem coava, o devotado amor que o Poverello dispensara à natureza, sua irmã, exemplo e apelo tomado agora como lição.
Aquilino Ribeiro foi escolhido como patrono deste Parque intimista e belo e isso, se não houvera outras razões, se adequava a esse sentimento de afeição que dedicava à natureza e vê-se quão perto ele estava, à sua maneira, de S. Francisco, basta ler as páginas mansas da abertura da Via Sinuosa e ouvir o cantar da fonte de cujas águas, diz a lenda, aquele santo bebeu. Só que Aquilino é também Mestre na arte de escrever, só que Aquilino escreveu densas páginas sobre Viseu, cidade da sua afeição, cidade de muitos amigos, cidade de múltiplas memórias. Só que Aquilino deveria ter tido honras de Prémio Nobel (Saramago dixit). Só que Aquilino mereceu o Panteão Nacional.
Mas ainda restam homenagens. A dos seus livros em nossa mão, a das suas mensagens de bem para cumprir, a de uma eterna memória para preservar.
Ali, no Parque, há uma memória que lá falta. A sua estátua. A perenidade do bronze. Como o dos sinos que soa até ao longe. Mágica representação de figura que cative, que nos envolva. Aquele desenho do homem igual a nós que se senta a uma mesa, íntimo e solene, exemplo do trabalho árduo, solitário e aberto … e a gente que se aproxima, e que por ali fica escutando o Malhadinhas que conta, Manuel Louvadeus teimando em defender a sua serra, o Brasileiro Dêdê entrando na Pensão Galharda e a raposinha do romance inventando facécias para a miudagem que ri. E Aquilino, íntimo e solene, esperando os amigos que voltarão ao fim da tarde, a pena molhada na tinta fecunda.
Alberto Correia in Jornal do Centro de 15 de Abril de 2011
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