O político e bispo D. Alves Martins é lembrado em Viseu, onde viveu grande parte da sua vida e morreu. As comemorações começam hoje, dia em que se assinala o bi-centenário do seu nascimento. Apesar de ter nascido em terras transmontanas (Granja de Alijó, a 18 de Fevereiro de 1808), Alves Martins foi uma figura marcante de Viseu, onde deu nome ao liceu e tem erigida uma estátua, no Largo de Santa Cristina, local onde esteve para ser fuzilado por motivos políticos. Na estátua, uma placa com duas frases reveladoras da incomodidade das suas palavras: "A religião quer-se como o sal na comida: nem de mais, nem de menos" e "Na minha diocese quero padres para amarem a Deus na pessoa do próximo, não quero jesuítas que vivam a explorar o próximo em nome de Deus".
Foi enquanto ministro do Reino, cargo que assumiu em 1868, que Alves Martins deu o impulso ao então Liceu de Viseu – que em 1911 passou a chamar-se Liceu Alves Martins – elevando-o à primeira classe e cedendo-lhe, gratuitamente, instalações condignas no Paço dos Três Escalões (onde hoje funciona o Museu Grão Vasco), que então era ocupado pela administração do concelho, fazenda, câmara e tribunal da comarca.
Por tanto dever a esta figura, o liceu, que hoje se chama Escola Secundária Alves Martins, promoveu um programa de comemorações do bi-centenário do seu nascimento, que arranca segunda-feira e se estende até ao final do ano, contando com a parceria da autarquia, do Governo Civil e da Diocese.
"Teve um papel muito importante na valorização do Liceu de Viseu, mas a acção dele não ficou por aqui", frisou à Agência Lusa Brito Castro, presidente do conselho executivo da escola.
Defensor das ideias liberais
Brito Castro destacou a sua dimensão de "político defensor das ideias liberais" e de "homem dotado de um forte sentimento humanitário, sendo consensual que apoiava todas as pessoas que na altura precisavam".
Nuno Pestana, professor da escola e membro da comissão das comemorações, explicou que, para segunda-feira de manhã, está prevista uma estafeta em ritmo brando entre os vários edifícios e lugares ligados à vida e memória de Alves Martins, aberta a todos os cidadãos que se queiram associar e onde, no final, não haverá vencedores. "Queremos ir à cidade e chamar a atenção das pessoas para esta figura", justificou.
Moralistas retiraram o seu nome ao liceu
Segundo as actas do Liceu de Viseu, por volta de 1937 as inscrições de Alves Martins foram acusadas de ter uma influência perniciosa na juventude. "Houve um movimento de pretensa moralização que culminou na retirada do nome de Alves Martins ao Liceu. O seu pensamento muito aberto, muito frontal e muito arejado levou a que não tenha caído muito bem nalgumas mentes, embora na altura figuras importantes de Viseu e do liceu tivessem feito a sua defesa", contou, acrescentando que o nome do bispo só foi reposto no liceu no pós 25 de Abril.
Entre as suas várias actividades, Alves Martins foi capelão na Armada, deputado, professor, enfermeiro-mor do Hospital de S. José, escritor e jornalista, além de bispo de Viseu, líder do Partido Reformista e ministro do Reino.Vários episódios demonstram a sua forma de estar na vida: recusou a comenda com que D. Pedro V pretendia premiar os seus serviços como enfermeiro-mor com o argumento de que "o simples cumprimento de um dever não torna ninguém credor de qualquer recompensa" e, já bispo de Viseu, incorreu em desobediência eclesiástica ao negar-se assinar a circular em que os bispos confirmavam a fé na infalibilidade pontifícia.
Alves Martins foi lembrado por vários escritores. Camilo Castelo Branco dedicou-lhe um esboço biográfico, destacando a faceta de jornalista e dizendo ser apreciador da sua escrita polémica. Aquilino Ribeiro destinou várias páginas da obra "Arcas Encoiradas" ao dia da inauguração da estátua, em 1911, nomeadamente as peripécias com a sua queda quando estava a ser içada, que a deixou danificada.
Escreveu o escritor que, na estátua, ficou para sempre "o bispo admirável, de ar severo, mas não façanhudo nem importante, teso e bem vertical, como era próprio da sua espinha e carácter".
Programa de comemorações
Na tarde de hoje terá lugar a conferência "No tempo de Alves Martins", por Isabel Vargues, da Universidade de Coimbra, e será inaugurada a exposição "Escritos e iconografia em torno de Alves Martins", que contou com a colaboração dos Arquivo Distrital de Viseu.
"A exposição mostrará as várias dimensões de Alves Martins, enquanto bispo, patrono da escola e político", explicou Nuno Pestana, acrescentando que poderá depois entrar em itinerância por entidades do concelho que a queiram aproveitar. Estão a ser pensadas várias outras iniciativas até ao final do ano, como momentos musicais e umas jornadas de reflexão, em Maio, no actual Solar do Vinho do Dão, que era o antigo Paço do Fontelo, onde Alves Martins morou e faleceu a 5 de Fevereiro de 1882, com quase 74 anos.
in Diário As Beiras (18-02-2008)
...artigo de opinião...
Hoje, passam assim 200 anos obre o seu nascimento.
Sem comentários:
Enviar um comentário